terça-feira, 26 de novembro de 2013

Turquia - Entre dois Continentes

A Turquia é um país enorme, com grande história territorial e cultural, com alguns traços em comum com o Brasil - a alta dívida externa, a posição de emergente, várias grandes empresas, um povo que vem melhorando suas condições de vida e um Presidente carismático, mas polêmico, Recep Tayip Erdogan. Vamos a mais algumas curiosidades sobre este país, mencionado em post sobre a Armênia e, também, cada vez mais conhecido dos brasileiros:



- A Turquia é, ao lado de Rússia e Egito, um dos três países a fazer parte de dois continentes política e geograficamente. A maioria (mais de 90%) do território está localizada na Ásia Menor e no Oriente Médio, mas há também uma parte europeia, que inclui parte de Istambul, a Trácia.

- Por falar em Ásia Menor (ou Anatólia), essa península tem muita história. Além dos turcos (os atuais habitantes, descendentes dos otomoanos), gregos, celtas, persas, macedônios, romanos, bizantinos e turcos seljúcidas dominaram a região.

- A cidade-estado de Troia, que muitos acreditavam ser mítica, foi localizada no noroeste da Anatólia. Não localizaram, porém, os cadáveres de Heitor, Ajax e Aquiles. Abaixo foto das ruínas.



- Os turcos vêm originalmente da Ásia Central e foram apenas alguns (sim, existem várias denominações de povos túrquicos) dos que chegaram à Europa Oriental e Oriente Médio entre o primeiro e o segundo milênio depois de Cristo. Também são túrquicos os búlgaros, apesar de usarem idioma eslavo, os albaneses, os azeris, os casaques, os usbeques e os tadjiques.

- O nome Turquia derivou de Türk que, nas antigas línguas turcomanas, significava "ser humano" ou "forte". Outra versão alega que Turquia originou de turquesa, pedra preciosa comum no país. Curiosamente, em inglês o nome do país, Turkey, também quer dizer peru.

- A cultura do país hoje deve muito a Mustafa Kemal, o Atatürk, que transformou o país em uma República entre a segunda e a terceira décadas do século XX. Ele decidiu pela adoção do alfabeto romano, com algumas modificações (anteriormente era usado o alfabeto árabe), pela laicidade do Estado e promoveu indumentária ocidental, deixando os famosos fez, chapéus turcos tradicionais em forma de pequenos baldes, de lado.  Também tem grande responsabilidade pela razoável liberdade de que gozam as mulheres turcas, quando comparadas a companheiras de outros países islâmicos.





- O Império Otomano, que deu origem à atual República Turca, englobava partes da Europa (Balcãs e Cáucaso), Norte da África e Oriente Médio. Foi durante os séculos XVI e XVII um dos mais poderosos impérios do mundo. Durou até o século XX, sendo chamado, em seus últimos anos, de grande doente da Europa.

- Muita gente acredita que o croissant, aquele pãozinho em forma de meia-lua, foi inventado na França. Errado, foi inventado em Viena, no século XVIII, quando a capital austríaca corria risco de invasão pelos turcos. Sobieski salvou Viena, mas a homenagem dos padeiros locais aos possíveis invasores ganhou admiradores no mundo inteiro.

- Herança dos tempos de Império Otomano, muitos habitantes da Turquia são etnicamente gregos, armênios, búlgaros, sírios, curdos e árabes. Isso faz com que muita gente diferente conviva e se misture no país, que tem uma enorme miscigenação.

- A capital do país, Ancara, é antiga, chamada de Ancira pelos romanos. Ao contrário do que se pode pensar, portanto, não é uma capital erguida do nada e planejada, como Brasília, Washington DC, Abuja (Nigéria), entre outras.

- Um dos maiores pregadores do cristianismo, o apóstolo Paulo, nasceu no Sul da Turquia, mais precisamente na cidade de Tarso. Por isso, ele era chamado de Paulo de Tarso. Detalhe: seu nome original é Saulo, portanto, Saulo de Tarso.

- Outro santo nascido em território turco foi São Nicolau, o padroeiro da Rússia, Noruega e Grécia. Chamado de Nicolau de Mirra, foi ele quem deu origem ao atual mito do Papai Noel. 

- O iogurte é, provavelmente, o produto de origem turca que você mais consumiu durante sua vida.

- Sabe o churrasco grego que você encontra no centro de sua cidade? Pois é, o nome certo seria churrasco turco. Preparar a carne num espeto giratório é um processo chamado por eles de suvlaki ou kebab. Os kebabs ganharam muitos adeptos em muitas cidades europeias, onde começaram a ser vendidos pela enorme colônia turca em países como Alemanha (10 milhões de turcos), França, Bélgica e Holanda. Abaixo, foto de um típico döner kebab, preparado por um imigrante turco em Hamburgo, na Alemanha.



- Curiosamente, quem levou o café e as tulipas para a Europa foram os turcos, não os austríacos (ou franceses) e holandeses, como se pode imaginar.

- Os turcos têm enorme rivalidade com gregos e armênios, dois povos que dominaram e massacraram, especialmente no início do século XX. Em geral, o Império Otomano era bastante tolerante com outras culturas. Uma pena que tenham deixado essa característica de lado em seus últimos anos.

- Os turcos adoram futebol. A seleção, apesar de só ter participado de duas Copas do Mundo, 1954 e 2002, sendo derrotada em ambas pelos times que viriam a ser campeões, é bastante respeitada, tendo feito boa figura recente tanto na Copa do Mundo de 2002, como na Eurocopa de 2008, na qual também alcançou as semifinais.

- A rivalidade entre os dois maiores times de Istambul (e do país) é tanta que o único McDonald's do mundo a não adotar as cores vermelho e amarelo está localizado perto da sede do Fenerbahçe, na parte asiática de Istambul. Com medo de rejeição, os donos trocaram o vermelho pelo azul escuro do Fenerbahçe.



- Caso fosse unicamente europeia, a Turquia teria a segunda maior população e o sexto maior Produto Interno Bruto do continente. Istambul estaria, seguramente, entre as quatro maiores cidades, ao lado de Londres, Paris e Moscou.

No próximo post, curiosidades sobre Istambul, cidade com mais história que muito país e algumas dicas de turismo no país. Para a despedida, aquela que é provavelmente a música turca mais famosa no mundo inteiro, além do hino nacional.








quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Montenegro: Turismo

Montenegro passou a ser um destino popular na Europa na década de 1980, quando a Iugoslávia tornou-se mais aberta ao intercâmbio. Com um patrimônio histórico, cultural e arquitetônico bem variado, além de natureza bem preservada, o pequeno país tem grande potencial atrativo. 

A falta de infraestrutura pode ser apontada como o principal entrave ao crescimento do turismo, que vem sendo bastante estimulado pelo governo. Tanto o interior como a costa adriática, apesar de bonitos e com uma população acolhedora, sofrem em comparação com outros países europeus e, também, com sua vizinha Croácia, um destino de massa do turismo europeu há pelo menos quinze anos.

As praias, lagos, castelos e capitais (a atual, Podgorica e a antiga, Cetnje) mostradas abaixo mostram, entretanto o enorme potencial do país. Com a possível entrada na União Europeia, o interesse deve aumentar ainda mais, especialmente por ser o país próximo à Croácia e contar com atrações bem diferentes. 






sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Montenegro: História Tumultuada

Origens até a Conquista Otomana

A região onde fica Montenegro, os Balcãs, é conhecida pelas inúmeras confusões lá acontecidas. E a história do pequeno país não destoa disso. A região foi parte do Império Romano e também do Império Bizantino, antes da chegada dos eslavos, ainda durante o primeiro milênio da era cristã. Esse povo se dividiu basicamente entre os eslavos do norte, tchecos, poloneses, eslovacos, rutenos, ucranianos, bielorrussos e russos e os eslavos do sul, sérvios, croatas, bósnios, eslovenos, montenegrinos e, dependendo do ponto de vista macedônios (não confundir com a região grega da Macedônia) e búlgaros, que são etnicamente túrquicos, mas linguisticamente eslavos.

Inicialmente, o território hoje pertencente a Montenegro continha três reinos; um deles, o Reino de Zeta, ficou mais forte entre o décimo e o décimo terceiro séculos de nossa era e tornou-se dominante na região. Muitos venezianos, que dominavam o comércio no Mar Adriático, chamavam o reino de Montenegro, traduzido internamente como Crna Gora e nome do país até hoje. Até o final do século XIV, o reino de Zeta tinha uma relação de vassalagem em relação ao Reino da Sérvia, ou seja, não era independente no sentido que concebemos hoje. Então, alguns governantes sérvios e montenegrinos se revezaram no comando de Zeta até o final do século seguinte, quando foi a última Monarquia a cair perante os otomanos, que a anexaram a um sanjak que correspondia, aproximadamente, à região de Sérvia, Montenegro, Albânia e Macedônia hoje.


Do Século XVII à Primeira Guerra Mundial

Desde o início, os montenegrinos eram um dos povos mais livres dentro do Império Otomano, contando com privilégios religiosos e tributários consideráveis. No entanto, nem isso parou o povo, ortodoxo, guerreiro e artístico, em sua luta contra o dominador estrangeiro. Durante todo o século XVII, os montenegrinos provocaram tumultos na região, finalmente derrotando os turcos definitivamente na chamada Grande Guerra Turca, no final desse século.
À partir daí, a região passou a ser dominada como uma Teocracia, pelos príncipes-bispos Petrovic-Njegos, com a unificação do país, apesar de tentativas de dominação venezianas e austríacas, vindo no século XIX. O carinho de Hobsbawm pelo país remete a essa época, na qual um pequeno reino montanhês de pastores, guerreiros, poetas, bandoleiros e bispos (muitas vezes um habitante era várias dessas coisas ao mesmo tempo) resistiram a tentativas de invasão de grandes impérios.

Nicolau I conseguiu, em 1878, através das Guerras Turco-Montenegrinas, aumentar consideravelmente o reino para regiões hoje pertencentes a outros países. Depois disso, passou a ter relações diplomáticas com o Império Turco-Otomano, que, finalmente, depois de dois séculos, reconhecera sua independência. Além de Nicolau I, outros heróis montenegrinos da época ficaram conhecidos no lendário balcânico, especialmente os que tiveram participação na Batalha de Grahovac, em 1858. Um nome importante é o De Knjaz Danilo, que inclusive emprestou seu nome para a primeira constituição do Principado, datada de 1855.

A situação era estável, até o ano de 1905, quando algumas forças políticas passaram a perseguir uma reunião com a Sérvia, novamente um Reino com força nos Balcãs, em contrariedade ao partido monarquista dominante. Em 1910, o país tornaria-se um reino, com vida curta. Apesar de vencer, junto com a Sérvia, as Duas Guerras Balcânicas (em 1912 e 1913), os montenegrinos seriam varridos pelo Império Austro-Húngaro ainda no início da Primeira Guerra Mundial. A libertação veio em 1918, quando decidiu-se pela reunião de Sérvia e Montenegro e um só reino.


O Século XX e a Independência

O reino formado inicialmente apenas por Sérvia e Montenegro logo passou a contar também com Croácia, Bósnia e Eslovênia, sendo oficialmente denominado Reino dos Sérvios, Croatas e Eslovenos. O oblast de Cetnje, espécie de condado, correspondia mais ou menos ao país atual. Depois, a região do país passou a fazer parte do banato de Zeta, junto com partes atualmente pertencentes a outros países. O Rei Alexandre I, neto de Nicolau, dominou o país no período entre guerras. Informalmente, entretanto, o país já era conhecido como Iugoslávia

Durante a Segunda Guerra, as forças de Mussolini, influenciadas pela rainha Elena, esposa de Vittorio Emanuele III e nascida em Montenegro, formaram um reino fantoche na região do país, tendo a Itália anexado a região litorânea de Budva. Mesmo após a saída da Itália da Guerra, em 1943, a Alemanha dominou a região com mão de ferro, só sendo derrotada e finalmente expulsa pelo Marechal Josip Broz, codinome Tito e seus partisans de toda a Iugoslávia nas proximidades do natal de 1944.

Tito retomou a Iugoslávia e fez dela uma República Federal Socialista. A capital de Montenegro, Podgorica, foi renomeada como Titogrado, a cidade de Tito, em homenagem ao líder. Importante notar que Milovan Djilas, famoso partisan, filósofo e escritor, era nacional de Montenegro.

Após a guerra, a infraestrutura iugoslava foi refeita, com consideráveis ganhos para Montenegro, muito bem representado no Governo devido ao enorme número de partisans lá nascidos. Apesar de ser a república menos povoada da federação, as benesses foram consideráveis para o país que, com o fim da Iugoslávia "grande" nos anos de 1990, continuou formando a Iugoslávia pequena ao lado da Sérvia.

Durante as Guerras Bósnia e Croata, os montenegrinos juntaram-se aos sérvios, procurando ganhos territoriais, especialmente a região de Dubrovnik, no litoral croata. Alguns oficiais montenegrinos seriam punidos anos mais tarde.

Em 1996, o governante Milo Djukanovic rompeu laços com a Sérvia de Slobodan Milosevic e, simbolicamente, a parte montenegrina da Iugoslávia passou a adotar o marco alemão como moeda. Não houve conflitos militares, no entanto, como nos casos dos outros países. O país passou a chamar-se Sérvia e Montenegro em 2002, ano anterior à adoção do euro por Montenegro, apesar de não ser parte da União Europeia. Em 2006, com pequena maioria em votação, foi tomada a decisão de separar-se totalmente da Sérvia, o que aconteceu em 03 de junho, com declaração do Parlamento.

Depois da Independência, o país já foi aceito na ONU e no Conselho da Europa, sendo também candidato à União Europeia (deve ser o próximo país do bloco) e OTAN.
 

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Montenegro - A Jóia dos Balcãs: Esportes e Curiosidades

Nesta semana, pretendo falar sobre um pequeno e novo país europeu, Montenegro. Ao lado de Sérvia, Bósnia Herzegovina, Eslovênia, Croácia e Macedônia, o país era um dos componentes da antiga Iugoslávia. Posteriormente, formou uma Iugoslávia menor e a República de Sérvia e Montenegro com seus vizinhos sérvios. O país, aliás, tem fortes laços com a Sérvia, com quem compartilha tradição cultural milenar. Mas analisemos melhor este pequeno e belo país.




Os brasileiros passaram a conhecer mais sobre Montenegro depois de um acontecimento curioso na Copa do Mundo de 2006: apesar de já separados, Sérvia e Montenegro disputaram a competição como apenas um país. Apenas dois jogadores da equipe eram montenegrinos, o goleiro Jevric e o atacante Vucinic, esse último famoso por ter jogado na Roma e estar atualmente na Juventus de Turim, ambos grandes times italianos.

Na década de 90 aliás, vários craques jogando por grandes equipes e pela boa seleção iugoslava eram da pequena nação de menos de um milhão de habitantes, com destaque para o meio-campista Dejan Savicevic e o atacante Predrag Mijatovic, campeões da Liga dos Campeões da UEFA, marcando gols na final, respectivamente por Milan e Real Madrid.

O futebol disputa com o polo aquático a preferência da população. Se no futebol a seleção, apesar de ter feito boa figura em grupo difícil das eliminatórias, não repete as grandes atuações iugoslavas, no polo aquático o país já obteve excelentes resultados, como o título europeu (conquistado contra a Sérvia) de 2008.

Quem lê o nome do país em inglês ou qualquer língua da Europa Ocidental pode se surpreender de sempre encontrar "Montenegro". O nome foi dado pelos venezianos, no final da Idade Média e acabou "pegando" em outros idiomas. O nome do país em seu vernáculo local "Crna Gora" quer dizer, literalmente, montanha negra. Outra curiosidade é que o país, antes da separação da Sérvia, adotava o marco alemão como moeda. Hoje, adota o euro, apesar de ainda não fazer parte da União Europeia.

Outros leitores podem lembrar-se de mais duas referências ao país: no filme Casino Royle, de 2006, James Bond participa de um torneio de pôquer na capital do país, Podgorica. As cenas, entretanto, foram filmadas em Karlovy Vary, na República Tcheca. E, por fim, os amantes da história como eu certamente se recordarão do carinho que o grande Eric Hobsbawm tinha pela "pequena nação montanhosa de monges-guerreiros nos Balcãs". A história deste pequeno país, muito rica e movimentada, será tema da próxima postagem.

Abaixo, foto da capital do país, Podgorica.


sexta-feira, 8 de novembro de 2013

O genocídio armênio

Neste que é o último post da semana, pretendo analisar brevemente o assunto que me fez reativar o blog, em conversa com o parceiro do www.xadrezverbal.com, meu bom amigo Filipe Figueiredo. Em postagem sobre a história turca no inicio do século XX, meu amigo acabou ficando sem espaço para tratar de um tema bastante espinhoso, possivelmente o mais controverso da história turca daquele período: o genocídio armênio. Abaixo, link de vídeo em inglês sobre o assunto (infelizmente não achei nada de qualidade em português):



Neste, que é considerado o primeiro Crime de Genocídio em Massa (MAC - sigla em inglês) do século XX, também o segundo maior da primeira metade do século passado, superado apenas pelo holocausto judaico à partir do final da década de 1930, o Governo do agonizante Império Turco-Otomano, em uma época que coincidiu com a Segunda Guerra Mundial, praticou a sistemática deportação e eliminação de armênios vivendo dentro de suas fronteiras, sob a alegação de traição à pátria - muitos dos armênios recusavam-se a fazer parte do exército nacional do Império que os dominava desde o século XV.

Apesar de ser chamado "o grande doente do concerto europeu", o Império Turco-Otomano ainda era militarmente muito responsável, como atesta a vitória de um certo Mustafa Kemal sobre a frota britânica (com enorme contingente australiano e neozelandês) em Gallipoli, episódio que quase custou a carreira política de Winston Churchill. Depois da Guerra, os mesmos Jovens Turcos, liderados pelo mesmo Kemal (conhecido como Atatürk, "o pai dos turcos"), derrotaram gregos e outros vizinhos e, de uma posição de força, negociaram novo tratado de paz com a Tríplice Entente, em substituição ao Tratado de Sèvres, o Tratado de Lausanne, assinado já em 1923, quase cinco anos, portanto, após o fim da Guerra.

É importante notar que havia um precedente: em 1909, por volta de vinte mil armênios já haviam sido massacrados pelo governo otomano. No entanto, esses números empalidecem comparados ao do genocídio, iniciado em 1915, com a prisão e deportação ou assassinato de inúmeros líderes armênios em Istambul, então capital do Império. À partir daí até 1919, por volta de um milhão de armênios morreria, assassinados de diversas formas, desde o afogamento e marchas forçadas até o uso de armas químicas e biológicas, como gases tóxicos e a inoculação de febre tifoide. Além disso, houve o fato de diversos outros terem sido forçados a trabalhar até a exaustão, em 25 campos de concentração espalhados pelo Império.



Até aí, até mesmo o último sultão do Império Turco-Otomano reconhecia a responsabilidade turca, especialmente do Ministro do Interior, Mehmet Talat, pelo genocídio armênio. Isso devia fazer parte dos julgamentos de Trabzon, após a Guerra, mas acabou sendo apagado pela tomada do poder pelos Jovens Turcos que, obviamente, não iriam produzir acusações e provas contra si mesmos quanto ao assunto. Cabe ressaltar que os países da Entente reconheciam o genocídio no Tratado de Sèvres, mas misteriosamente esqueceram-no no Tratado de Lausanne, bem menos rigoroso com o República Turca, sucessora do Império Turco-Otomano, liderada por Atatürk. Também os soviéticos, que herdaram o território armênio e tiveram em Atatürk um de seus primeiros aliados, fizeram vista grossa para com o massacre.

Hoje, mesmo sendo um país plural e democrático, a Turquia não reconhece o genocídio e quem o faz, além de correr risco de ser processado criminalmente, é visto como pária. Para os turcos, os armênios eram traidores de guerra, que sofreram a punição merecida. Muitos países, especialmente ocidentais, reconhecem o genocídio armênio, mas parece pouco para o sofrimento do povo, que até hoje não se recuperou cultural e demograficamente de um massacre ocorrido já há quase cem anos.



Para encerrar, uma frase do perpetuador do maior genocídio do século passado. Vários estudiosos afirmam que em 1939, pouco antes de invadir a Polônia e dar vazão ao massacre de judeus, eslavos e ciganos, Hitler teria se saído com a seguinte pérola:
Afinal quem fala hoje do extermínio dos armênios?

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

A Armênia e a música

Dando seguimento aos posts sobre a Armênia, falemos de outros descendentes que influíram bastante na cultura ocidental, desta vez na música. A diáspora armênia, que será melhor tratada no próximo post, distribuiu a gente do país caucasiano em várias outra localidades, com destaque para os Estados Unidos, a França, Rússia, Irã e o Cone Sul.

Assim como no esporte, muitos descendentes de armênios se destacam (quase todos aqui continuam vivos) na música, nos mais variados estilos. Começando pelo clássico, temos Aram Khatchaturian, que compôs a famosa Dança dos Sabres.



Na música popular mais antiga, talvez saudosista, temos o grande Charles Aznavour, que apesar de idoso ainda tem uma voz esplendorosa e vem para o Brasil com frequência. Seu verdadeiro nome, Garabed Aznavourian, deixa claro que o intérprete de "La Boheme" só fez nascer na França, país no qual é idolatrado, uma espécie de Frank Sinatra gaulês. Abaixo, seu grande sucesso:



Chegando à música popular mais atual e, por que não, ao rock, temos Cher. A cantora, atriz e figuraça americana chama-se Cherilyn Sarkisian e começou a fazer sucesso nos anos 60 com "I Got You Babe", gravada junto com Sonny Bono. Depois, tornaria-se uma cantora solo e atriz de muito sucesso, tendo, inclusive, gravado uma música muito associada ao movimento GLBT no mundo inteiro, "Believe", cujo link segue abaixo. 



Apesar dos boatos, tudo leva a crer que o vocalista do Linkin' Park não é filho dela. Outra banda de nü metal, entretanto, tem um vocalista muito ligado à Armênia: o System of a Down. Com uma mistura interessante de heavy metal, influências armênias, crítica social e mais uma porção de coisas, a banda começou a destacar-se na década de 2000. Seu vocalista, Serj Tankian, é um produto exemplar da diáspora armênia: nasceu em Beirute, no Líbano e, com a Guerra Civil na "Paris do Oriente", veio para a América. É um grande defensor da maior exposição do holocausto armênio em todo o mundo e, na opinião do blogueiro, um dos músicos mais criativos surgidos nos últimos anos.



Falando em holocausto armênio, será o tema do último post da semana. Muito obrigado pela leitura.

segunda-feira, 4 de novembro de 2013

A Armênia e o esporte ocidental

Nerds costumam ter simpatia gratuita por algumas nações. Muita gente gosta de outros países por ter boas experiências de vida, turísticas ou não, nestes países. Ou por ser bem tratado por seus povos ou descendentes deles. Fique bem compreendido que aqui falamos apenas de países dos quais gostamos não levando em conta as razões mencionadas.

Como eu sou nerd, tenho minha quota, claro. Apesar de gostar da culinária dos três, por exemplo, tenho muita simpatia pela Sérvia (e pela sua antecessora, Iugoslávia), pelo Uruguai e pela Armênia.

Como um comentário que fiz sobre o holocausto armênio no excelente blog www.xadrezverbal.com, é a nação do Cáucaso o tema de hoje.

Apesar de ser um país pouco populoso e visitado por pouca gente deste lado dos Urais, a Armênia tem uma influência muito grande na cultura Ocidental. Foi, por exemplo, um dos primeiros países oficialmente cristãos do mundo, disputando a primazia com a Etiópia e seus coptas. Os armênios eram um Império independente à época de sua cristianização, há 1.700 anos, ainda que sob influência dos Impérios Romano e Persa.

Tem um alfabeto próprio, um legado literário todo particular, uma culinária interessantíssima e que não é uma mera derivação das cozinhas do Oriente Próximo ou turcas que muita gente prega. Há, inclusive, alguns representantes na Cidade de São Paulo, dos quais destaco, sem medo, a Casa Garabed, escondida numa rua residencial de Santana, aonde comi as melhores esfihas de minha curta passagem na Terra.

Mas neste post, falarei sobre dois temas bastante específicos: esportes e música. E o raro leitor pode perguntar: mas que porra os armênios fizeram pelo esporte ocidental?

Pois bem, representantes da diáspora armênia estão entre os maiores expoentes em alguns esportes com grande número de seguidores. Comecemos pelo exemplo mais conhecido pelos brasileiros, o grande rival de Ayrton Senna e Nelson Piquet, Alain Prost.




 
Francês, o "professor" é filho de uma imigrante armênia e fala o idioma caucasiano sem grandes problemas. Tetracampeão mundial e segundo maior vencedor de corridas da história da Fórmula 1, Prost é considerado por especialistas o piloto intelectualmente mais brilhante da história da categoria. Por seu sobrenome não trazer o característico "ian" (seu sobrenome armênio seria Karatchian), o grande público não liga Prost à Armênia.

Passando a outro esporte de grande alcance, temos no tênis um ícone e um grande jogador de ascendência armênia: trata-se de André Agassi e David Nalbandian (os dois primeiros em pé da esquerda para a direita na foto abaixo).




Nalbandian não chegou a vencer um Grand Slam, apesar de ter vencido torneios da segunda categoria mais importante no circuito profissional de tênis. Perdeu em Wimbledon, na final para Lleyton Hewitt, ainda no começo da carreira e, depois, consagrou-se como um jogador extremamente habilidoso e, por vezes, fez grandes partidas, especialmente contra Roger Federer, apesar de sua barriga proeminente.

Já André Agassi é um dos maiores da história do esporte. Rebelde, talentosíssimo, vencedor, o carequinha (ou perucado) jogador é filho de um armênio que primeiro se refugiou no Irã e depois mudou-se para os Estados Unidos. O pai de Agassi foi seu principal incentivador e treinador no começo da carreira e, curiosamente, era praticante do esporte no qual a Armênia, como país, conseguiu seus melhores resultados: o halterofilismo.

Por fim, passemos ao esporte mais popular do mundo: o futebol. Durante a era soviética, era normal ao menos um jogador armênio fazer parte dos 22 CCCP; entretanto, após a separação, com exceção das atuais Eliminatórias, aonde fizeram boa imagem especialmente graças ao habilidoso meia Henrikh Mikhtaryan, do Borussia Dortmund, a Armênia tem resultados pífios, normais para um país recentemente emancipado, de população pequena e cujas riquezas naturais não são exatamente prodigiosas.

Por outro lado, a seleção francesa de 1998 tinha dois descendentes de armênios: Youri Djorkaeff e Alain Boghossian. Djorkaeff era mais conhecido e, também, melhor tecnicamente. Tinha também o fato, que pode ser relembrado por jogadores de FIFA, de ser um dos poucos a não licenciar o uso de seu nome nas edições de 99 e 2000 do jogo, nas quais ficou conhecido simplesmente por Six (o número que usava, em francês). Boghossian era habilidoso, jogou em alguns bons times, como o Parma do final da década de 1990, mas sofreu muito com contusões. Em jogo comemorativo recente, mal conseguiu correr, apesar de ainda ser jovem, graças a inúmeras operações, algumas delas mal sucedidas.



Gostou do post? Comente, seus comentários e sugestões são muito bem vindos. Ainda durante a semana, mais dois posts sobre a Armênia. E nenhum deles será sobre a antiga estação da Ponte Pequena do Metrô de São Paulo